Histórias de bobos, bocós, burraldos e paspalhões

Ática | 2009

Histórias de bobos, bocós, burraldos e paspalhões foi publicado pela primeira vez em 2001 e trazia versões de quatro contos populares.

Nesta nova edição, ampliei o livro com mais duas histórias, mantendo o mesmo princípio: todas as narrativas giram em torno do herói tolo.

Na edição anterior, fiz as ilustrações em branco e preto, com tinta nanquim, usando uma técnica que venho desenvolvendo há tempos a partir dos recursos da xilogravura popular. Para a edição atual, aproveitei os mesmos desenhos mas com aplicação de cores. Isso deixou as imagens mais alegres e cheias de vida.

Desde 1986, venho recontando histórias populares. Após a pesquisa e escolhido o conto, tento encontrar outras versões da mesma história e, a partir daí, fazer uma nova, buscando sempre, claro, recuperar o que na minha leitura pareceu ser a essência de cada enredo.

O primeiro conto, “Pega-trouxa-de-papo-furado”, na verdade, nunca existiu. Foi criado a partir de pequenas anedotas populares: as desavenças dos irmãos bobos briguentos, o caso do mentiroso que afirma ter acabado de chegar do céu e a anedota, recorrente em inúmeras histórias, do chapéu que, no lugar de um pássaro raro, tem um monte de excrementos.

Em “O casamento de Mané Bocó”, juntei um episódio típico dos heróis tolos – o caso da venda da verdura ao santo de madeira – com o pequeno conto do peixinho encantado que, grato por ter sido salvo, ensina palavras mágicas e ajuda o herói, bobo que só ele, a se casar com a linda princesa que nunca ria.

Construí “Façanhas do Zé Burraldo” com base em vários episódios populares avulsos – o caso do poço, o roubo do burro, o burro que descomia dinheiro, a anedota do teatro e o caso do “adivinho” que culmina com o enterro do herói que pensa ter morrido –, que fui recolhendo aqui e ali mas que, por si só, não formavam um enredo com começo, meio e fim.

“Chico Zoeira” é uma narrativa popular completa. Encontrei várias versões dessa história e a partir delas construí a minha. Seu herói, um homem fraco da idéia mas honesto e de bom coração, é enganado e enrolado diversas vezes mas no fim acaba se dando muito bem.

“João Bobão e a princesa chifruda” também é a versão de um conto com começo, meio e fim. Nele, certa viúva muito pobre tem dois filhos: o mais velho é inteligente, mas o outro é burro feito uma porta. Graças a um ovo encantado, a mulher descobre que o destino do filho mais velho é tornar-se sábio e que o do mais moço, apesar de bobo, é virar rei e se casar com uma linda e caprichosa princesa.

O último conto, “Quanta besteira o mundo tem!”, é uma narrativa relativamente conhecida. Encontrei várias versões com diferentes episódios e procurei selecionar os que me pareciam mais interessantes. Não resisti e acabei inventando dois deles. No geral, trabalhei a partir de versões portuguesas do conto pois, até onde sei, a história completa nunca foi recolhida no Brasil, a não ser em episódios soltos que aparecem, por exemplo, em alguns casos do “PedroMalasartes”, entre outros.

Muitos contos populares apresentam heróis valentes e invencíveis que, desafiando forças mágicas e superiores, invadem castelos inexpugnáveis, enfrentam dragões, bruxas e gigantes e acabam encontrando o tesouro, casando com a princesa e subindo ao trono. Alguns poucos contos, porém, trazem heróis tolos, bobos, burraldos, bocoiós, distraídos, que se confundem, são ingênuos, fracassam, fazem mil coisas erradas, mas no fim, meio sem querer, sempre ou quase sempre acabam se dando bem.

No fundo, esses heróis atrapalhados são mais humanos e, na sua fragilidade, muito mais parecidos com todos nós.