Contos de Adivinhação

Ática | 2008

Sobre adivinhas e adivinhões

Longe de ser apenas brincadeiras com palavras, todas as adivinhas costumam também ser metáforas. Ou seja, dizem uma coisa mas, ao mesmo tempo, querem dizer outra. Por exemplo, quando ouvimos: “A moça é uma flor” sabemos que o tal moça não tem folhas nem pétalas nem raízes mas sim que é bela, cheirosa e delicada. É uma moça e, também, é uma flor. Isso é uma metáfora.

Em geral, as adivinhas funcionam da mesma maneira. Se alguém pergunta: “o que é que cai de pé e corre deitada?” já sabemos que o sujeito está falando da chuva. Se pergunta: “o que é que quanto mais se perde, mais se tem” sabemos que está falando do sono.

A adivinha, portanto, pode ser considerada uma espécie de introdução à linguagem poética, mas mais que isso.

Nas sociedades antigas, druidas e sacerdotes eram admirados justamente porque

sabiam decifrar enigmas. E, para esses povos, os enigmas traziam sempre um conhecimento sagrado sobre a existência e o mundo.

Vejam as perguntas feitas pelo imperador Frederico II (1194-1250) a MiguelEscoto, o astrólogo da corte: “Sobre que se assenta a terra? Quantos céus existem? Como é que Deus se senta em seu trono? Por que a água do mar é salgada? Quais são as causas das exalações e erupções vulcânicas? Como se explica que as almas dos mortos não desejem regressar à terra?”

Eram perguntas cabeludas e muito perigosas.

Perigosas porque se o adivinho conseguisse responder era louvado e considerado

um grande sábio. Em compensação, se falhasse, era condenado à morte e ia para o beleléu.

Segundo os pesquisadores do assunto, com o desenvolvimento da civilização, o enigma ganhou dois sentidos diferentes: de um lado virou questão de filosofia. De outro virou simples divertimento.

Tudo isso, leitor, para dizer que as adivinhas, herdeiras de antigos enigmas, também costumam ter esse duplo caráter: são filosofia sobre a existência e o mundo e são brincadeiras. Ao mesmo tempo!

Basta a gente examinar as adivinhas populares para encontrar, muitas vezes, pequenas especulações que nos fazem meditar, compreender ou atentar melhor, sempre afetiva e intuitivamente, para inúmeros assuntos da vida e da natureza:

Campo grande
Gado miúdo
Moça formosa
Pai Carrancudo

R. céu, estrelas, lua e sol

Quanto mais cresce menos se vê?
Quanto mais se tira menor fica?
Sempre se quebra quando se fala?

R. escuridão, buraco, segredo (ou silêncio)

Quem faz nunca vai querer
Quem compra não quer usar
Quem usa não pode ver
Quem vê não vai desejar?

R. o caixão de defunto

Pois bem, os contos de adivinhação fazem parte disso tudo. Com seus heróis espertos, criativos e inteligentes, muitos deles herdeiros dos antigos druidas; seus reis que não sabem ser felizes; princesas que só casam com quem souber se esconder direito; soldados poetas jogadores de baralho; amigos ricos e amigos pobres; arvores adivinhonas; mães mais malvadas que bruxas e malandros cheios de truques e ardis, esses contos populares, além de brincadeiras, também trazem pensamentos e dúvidas sobre os assuntos da vida da gente.